Nós temos aqui uma coisa única

“Nós temos aqui uma coisa única”, diz promotora do Festival de Etnias

Ao longo dos séculos XIX e XX, o Paraná recebeu imigrantes de diversas partes do mundo, desde países vizinhos da América do Sul até o extremo Oriente. Espanhóis, alemães, gregos, holandeses, italianos, poloneses, israelenses, ucranianos e japoneses vieram para cá, estabeleceram-se e influenciaram os modos e costumes locais. Mais recentemente, foi a vez dos expatriados de países mais próximos, como a Bolívia e o Haiti.

É esse caldo de cultura que vem à tona nas edições do Festival Folclórico de Etnias, que este ano acontece de 2 a 13 de julho, nos palcos do Teatro Guaíra e do Guairinha.

“Temos aqui uma coisa única, não se vê isso em outro lugar”, afirma Blanca Hernando Barco, presidente da Associação Interétnica do Paraná (Aintepar). A entidade é uma das realizadoras do Festival de Etnias, em parceria com a Trento Edições Culturais e a Universidade Livre da Cultura (Unicultura).

Em 2017, o Festival chega a sua 56ª edição. Quando começou, em 1958, era um evento bastante amador e tinha um caráter muito forte de exaltação da pátria de origem dos imigrantes. “No início, quem fazia o Festival eram os primeiros imigrantes, ou então os filhos deles. A saudade da terra onde nasceram era muito grande, porque a saída era muito recente”, conta Blanca.

Quase 60 anos depois, no entanto, entre os 17 grupos que se apresentarão no Festival de Etnias, há os que já tenham quase cem anos, como o Folclore Ucraniano Barvinok, com 94. Esse espaço de tempo permitiu não só o aperfeiçoamento técnico e artístico das agremiações como também influenciou a origem dos integrantes que as compõem. A necessidade de afirmação na nova terra foi se diluindo com o passar dos anos. Hoje, em cada um dos grupos que fazem parte da Aintepar, Blanca calcula que cerca de metade dos participantes sejam de fato descendentes diretos dos imigrantes originais. “A outra metade são pessoas que se identificam com aquela cultura ou manifestação artística”, explica. “Mas isso não quer dizer que perdemos o respeito pela tradição. Nós temos um compromisso com a autenticidade.”

Auge

Em 1959, quando estava apenas em sua segunda edição, o Festival já chamava a atenção da população e também da administração pública. Tanto que foi neste ano que o Governo do Estado o colocou no calendário oficial. Icônico, o evento também fez parte do roteiro de reinauguração do Teatro Guaíra, depois do incêndio de 1970.

Na década de 80, o Governo do Paraná ainda passou a considerar o Festival “um evento permanente, de obrigatória realização”.

Era o auge do Festival e dos grupos étnicos em Curitiba. “Há 40 anos, a programação do momento era o Festival. Essa era a opção de lazer”, lembra Blanca. “Mesmo no restante do ano, eu passava o tempo todo no Centro Espanhol”, continua ela, que é filha de espanhóis que chegaram ao Paraná nos anos 1950, quando a terceira e maior leva de imigrantes ibéricos veio para cá. Foram eles que fundaram, em 1969, o Centro Espanhol.

Hoje, apesar do bom público registrado todos os anos, Blanca avalia que o Festival perdeu visibilidade. “Você tem a globalização, as pessoas têm muitas opções, às vezes precisam decidir se vão ao Festival ou se vão ver o Almir Sater uma semana antes.”

No entanto, ela acredita que o evento é mal explorado pela administração pública. “O Festival deveria ser uma marca de Curitiba. Deveria ser vendido para o Brasil todo”, pontua.

Padrão de qualidade

Embora não seja feito por artistas profissionais, o Festival de Etnias empenha-se por manter o nível técnico de suas apresentações. Prova disso é que o Grupo Folclórico Ucraniano Poltava, por exemplo, se classificou recentemente para a mostra competitiva do Festival de Dança de Joinville, tido como o maior do mundo.

Desde quando foi fundada, em 1974, a Associação Interétnica do Paraná trabalha para estabelecer uma unidade entre os grupos folclóricos, com regras e “padrão de qualidade”. A Aintepar estabelece, por exemplo, que todas as agremiações devem ter um estatuto. Além disso, elas devem seguir um cronograma de ensaios e comprometer-se em participar das apresentações públicas promovidas pela associação.

Dentro de todos os grupos, há obrigatoriamente espaço para crianças, que já com quatro ou cinco anos de idade começam a ensaiar e promover espetáculos. “Quem não tiver um grupo infantil não tem futuro. Sem falar que para preparar um folclorista você leva pelo menos dez anos”, explica Blanca. “Não é simples nem rápido. Muitas dessas pessoas dedicam boa parte de suas vidas a preservar a cultura de seus antepassados”, finaliza.

 

Serviço

Festival Folclórico de Etnias

De 02 a 13 de julho

No Teatro Guaíra e no Guairinha

Confira a programação: www.festivalfolclorico.com.br

 

Legenda da foto: O grupo ucraniano Barvinok, no Teatro Guaíra, ontem (domingo, 2), durante a abertura do Festival Folclórico de Etnias.

 

Crédito da foto: Brunno Covello.